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- Rápido pessoal!... A gente conhece o Panamá na volta de
Cuba!
- Mas isso aqui nem é o Panamá, é só o aeroporto!
Do longo corredor central saíam outros três, o espantado amarelo
das barras de aviso indicando a direção, e, afinal, um salão hexagonal, cadeiras
de espera e, em cada face, um portão (ou puerta
ou gate), e, bem em frente, o 28.
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Embarque no 28 |
Pela aflição dos alto-falantes e o nervosismo dos painéis
de voos, começaram a entender o conceito básico de hub, um aeroporto centralizador de conexões aéreas, e as suas características:
diminuição de custos para a companhia aérea dominante, garantia de boa
clientela para as lojas associadas e séria tendência a assustar viajantes
inexperientes...
O voo para Bogotá, pouco mais de uma hora, a noite chegando,
foi monótono. Elói e Eliete nem se deram ao trabalho de arrumar a bagagem de
mão no bagageiro, levaram no colo. As luzes se apagam, silêncio absoluto entre
os membros da Zás-Brás: como resultado das sete horas da viagem Rio-Panamá, e mais
a tensão da conexão acelerada, caíram no sono. Eliete manteve-se vigilante, uma
das formas pelas quais as preocupações se manifestam...
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Eliete aflita |
Coubera a ela, na divisão dos trabalhos de última hora,
pesquisar na internet e reservar um hotel bom, barato e bem perto do aeroporto de
Bogotá, para passar a noite (melhor, parte dela) e Eliete não tinha a menor
certeza de que fizera uma boa escolha... Considerando o alto grau de
irreverência (mais precisamente, de mordacidade) de seus velhos companheiros, só
em pensar que o tal hotelzinho pudesse ser uma arapuca, ia-lhe crescendo uma
aflição com chance de virar o mais puro pavor. Um segredo que guardava há
décadas: fazia de tudo para não despertar o deboche alheio, principalmente destes
seus amigos, verdadeiros profissionais do ramo. Relação altamente perigosa para
ela, e a administrava sem o menor deslize há dezenas de anos, praticando os
mais cuidadosos gestos. Difícil mesmo, e sempre fora, a aproximação da
definição entre fracasso e sucesso. Passara por isto muitíssimas vezes, clandestinamente,
em segredo absoluto, eles não sabiam de nada... Para o medo não vir à tona, melhor assistir
sem ver qualquer coisa na telinha...
Na chegada, avião taxiando, e Rolé, não explicou o motivo, parecia
agitado... Normal o controle da imigração, apesar, estavam na Colômbia, da
aparatosa equipe de agentes alfandegários, muito bem uniformizados. O fecho-ecler metálico da bolsinha de Leonil,
com algum dinheiro vivo por baixo das calças, acionou o alarme do arco do
detector de metais, já acontecera o mesmo no Panamá. Tudo bem, mais uma vez bastou
afrouxar o cinto e arriar o cós: o policial entendeu o motivo do alarme e liberou.
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Eliete reconhecida |
Rolé continuava fazendo, desde o pátio de manobras, a sua
melhor cara de burro diante do palácio, até que, atravessando as grandes
portas de vidro da fachada do prédio e chegando ao pátio central entre as duas
alas, a caminho do estacionamento, iniciou um monólogo:
- Cara, aqui fora também!... É impressionante!... Que
grande ideia!...
Haviam ouvido muitas histórias sobre surpresas e perigos da
Colômbia e Rolé, talvez por conta de seu olhar vidrado, criara um desassossego
geral, exceto para Eliete, ainda curtindo o inesperado sucesso. Formou-se,
rápido, se não um gabinete de crise, ao menos um círculo de surpresa, e Rolé viu-se
obrigado a desembuchar:
- A iluminação é toda amarela... Ou melhor, dourada!... Tanto
na pista dos aviões quanto aqui, na entrada do aeroporto!...
- Quê que isso tem a ver?..., Gastão imediatamente criticou.
Esse tipo de luz é muito comum por aí, em qualquer lugar...
- Sim, mas nós estamos em El Dorado, o aeroporto de
Bogotá!... Pode conferir: todas as luzes externas são douradas!... Pense bem,
gente boa: é claro que se trata de uma grande jogada de marketing!... E os
colombianos são muito bons nisso... Sim!... É simples: o prédio forma um grande
anfiteatro, duas alas que se interligam. Está tudo pronto: a iluminação dourada
cria o cenário!... A gente chega, começa o espetáculo!... De repente, estamos em
pleno palco!... Genial!... Tudo a ver!
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O anfiteatro dourado |
Dormir cedo tinha mais a ver... O voo para Cuba saía às 6,50h da manhã, precisavam estar de volta ao El Dorado lá pelas quatro da matina, e os seus nada impressionados companheiros saíram negaceando as cabeças na direção da van. Apenas Egberto deu meia trava, parada para falar com seus zíperes: “Muita bobeira!... Bem, pelo menos um de nós pensa em teatro o tempo todo...”
Em doze minutos estavam diante do balcão de recepção do
Bogotá on Holidays. Ficava num bairro próximo, área residencial de classe média
baixa, bem à frente de uma praça sossegada, pelo que a noite permitia ver. Bem
escolhido, o que não quer dizer que Eliete não devesse ter razão suas
preocupações... O problema não estava no hotel, mas na reserva. A Zás-Brás
Elucubrações Artísticas era formada por sete artistas, porém Eliete, até por
falta de opções, reservou apenas dois quartos triplos, ou seja, apenas seis artistas
tinham lugar garantido. Tudo bem... O gerente do hotel não se incomodou com o acréscimo
de mais um hóspede (cobrando, naturalmente, uma taxa extra): o problema era a
inexistência de uma cama extra...
Transferida a questão para a trupe, uma negociação rápida,
rascante e mal humorada. Alguém dormiria no chão ou, em outra estratégia, dois
ou três se apertariam em uma única cama. Decisão complicada demais, quando se
está no bagaço, após chacolhar um dia inteiro em ambiente tão apertado quanto:
todos queriam o máximo de espaço para dormir!
O gerente mostrou as chaves, Rolé deu o bote. Foi dada a
largada para outra corrida de obstáculos, malas, escadas, vagas no elevador de
portas pantográficas... Ficou para trás, tentando se explicar, a própria Eliete.
Contou, ao menos, com a solidariedade constrangida de Elói: dividiram uma cama
de solteiro...
Tudo certo, e as cabeças de pedra já baixavam nos
travesseiros, mas houve tempo para Leonil se aproximar de Egberto e relembrar a
angustiante preocupação:
- Chefia, a gente vai mesmo chegar a Havana a tempo de
assistir à estreia da seleção brasileira?...
- É claro que sim, Leo. Calculei os horários mais de mil vezes...
- Certo, chefia, mas... Mas, a televisão lá de Cuba vai mesmo transmitir os jogos da Copa, garante?...
- Leo, sério mesmo... Vai dormir, porra!
Tudo isto dava um sono...
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PaCuCoBras [grupo
fechado] – Comentários:
Eliete Barbosa Nada a ver! Que segredo, coisa nenhuma! Mas, é cada
coisa que esse povo diz! Eu respeito todo mundo, só quero que me respeitem. Imagina,
ter medo de que debochem de mim. Queria ver alguém se atrever! Todo mundo tem
direito de errar, poxa!
Leonil de Moura Ah,
admita, Lili, vc marcou a maior bobeira, reservou errado...
Eliete Barbosa Que errado o quê! O cara é que entendeu
mal, não tenho culpa. E se eu pedisse um quarto mais, sei lá se tinha. Nil, não
enche! Bobeira deu o Rolé, com aquela história de luzes amarelas...
Rolé de Matos Qual
é, garota?... Não vem com essa não, que vc não entende nada de cenografia, muito
menos de recursos simbólicos, e os caras são bons nisso. Todo mundo entendeu, só
vc que não. Aliás, nem entende nem de secretariar um grupo teatral...
Elói de Holanda Pera
aí, Rolé, qualé? Todo mundo tem direito de errar, ela mesma disse. Errou, mas
pediu perdão, Deus perdoa. Graças a Deus, deu tudo certo, só a gente dormiu
apertado, não vem não...
Gastão Cavalcanti E o stress que deu?...
Sinceramente, não tinha necessidade. O hotelzinho nem era tão ruim assim, nosso
grupo é que dormiu embolado.
Eliete Barbosa Olha
aí, vocês vão toma...ndo conta dos seus assuntos! Hehehe, é isso aí, que nem a
garotada dizia antigamente...
Russa Pimentel Essas cobranças são muito chatas,
deixem a Lili em paz. Ela fez o que podia e pronto. Se o Rolé viu estrelas no
aeroporto, também devia ter curtido a noite no hotel como um momento de
congraçamento coletivo, talvez um happening solidário...
Berto Triz Tonho Faz
seguinte, pessoal: considerem a situação como uma primeira experiência de
terceirização das nossas atividades, ok? Quem gostou, gostou; quem não gostou,
aguente. E agora já passou.
Eliete Barbosa Valeu,
gente.
Rolé de Matos Valeu?...
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